
Sabe aquele gráfico de pizza que aparece em toda apresentação de PowerPoint, relatório de marketing ou dashboard de reunião? Então… ele tem uma longa história — e uma reputação nada tranquila. Já foi ícone de inovação, depois virou símbolo de tudo que não se deve fazer em visualização de dados. Mas será mesmo que ele merece essa fama toda?
Vamos dar uma volta na história do gráfico de pizza, entendendo como ele surgiu, por que foi tão criticado e, mais recentemente, por que voltou a ser defendido. Spoiler: a discussão é boa e envolve gente de peso como William Playfair, Cleveland & McGill, Edward Tufte e Robert Kosara.
William Playfair — o pioneiro incompreendido dos gráficos
Lá no final do século XVIII, quando ninguém nem sonhava com Excel ou Power BI, o engenheiro escocês William Playfair ousou algo revolucionário: explicar economia com imagens. Inspirado pelas ideias visuais de Joseph Priestley, que havia criado linhas do tempo mostrando a vida de figuras históricas, Playfair pensou: “se eu transformar números em formas, mais gente vai entender”.
Nasciam aí os gráficos de linha, barra e, mais tarde, o polêmico gráfico de pizza — apresentado em sua obra Statistical Breviary (1801), como uma forma intuitiva de mostrar como as riquezas do Império Otomano estavam divididas. Visualmente, era como fatiar uma torta entre países.
Mas sua ideia foi rejeitada pela comunidade matemática da época. Os acadêmicos viam os gráficos como artifícios pouco científicos, quase infantis — uma linguagem “decorativa” demais para tratar de assuntos sérios. O gráfico de pizza, então, foi ignorado por décadas, considerado visualmente apelativo, porém analiticamente fraco. O “impacto visual” que Playfair buscava foi, ironicamente, o que o desqualificou perante seus pares.
No entanto, Playfair não queria precisão cirúrgica — queria clareza. Queria comunicar com impacto e rapidez num tempo em que muitos não sabiam sequer ler ou fazer contas. Seu legado foi abrir caminho para a visualização de dados como conhecemos hoje.
“Um jeito elegante e fácil de mostrar como partes compõem um todo. Às vezes, entender é mais importante do que medir com régua.”
Willian Playfair


Cleveland & McGill (1984) — os cientistas da percepção
Avança pra década de 1980. A visualização de dados já era uma prática comum, mas faltava um embasamento sobre como ela funcionava na mente humana. Foi aí que entraram William S. Cleveland e Robert McGill, dois pesquisadores que decidiram investigar como as pessoas interpretam diferentes tipos de gráfico.
Eles publicaram um estudo clássico que mostrava: somos ótimos em comparar comprimentos (como em gráficos de barra), mas péssimos em julgar ângulos e áreas — justamente as variáveis perceptuais usadas nos gráficos de pizza.
Ou seja: se você precisa que alguém compare valores com precisão, o gráfico de pizza não é uma boa escolha. Eles defenderam que existem formas mais eficazes de transmitir as mesmas informações — com menos chance de erro visual.
“Bonito? Talvez. Eficiente? Nem tanto. Se você quer que as pessoas comparem valores com precisão, o gráfico de pizza é uma escolha ruim.”
Cleveland & McGill
Edward Tufte (2001) — o cara do “menos é mais”
Avançando para o início dos anos 2000, temos Edward R. Tufte, considerado o papa do design de informação. Em seu livro The Visual Display of Quantitative Information, ele introduz o conceito de data-ink ratio — isto é, quanta “tinta” no gráfico realmente representa dados, e quanta é pura decoração.
Tufte é um crítico feroz do que chama de chartjunk — enfeites desnecessários que poluem a informação. E, para ele, o gráfico de pizza é praticamente o mascote do desperdício visual: ocupa muito espaço, usa cor demais, dificulta comparações e contribui pouco com dados reais.
“Desperdício de tinta. Um gráfico que tenta parecer útil, mas só ocupa espaço e confunde.”
Edward Tufte
Robert Kosara (2019) — o advogado do gráfico de pizza
Quando parecia que o gráfico de pizza estava prestes a ser exilado de vez dos dashboards, surge Robert Kosara, pesquisador contemporâneo, com seu artigo In Defense of Pie Charts. Ele reconhece as críticas, mas propõe uma visão mais equilibrada.
Kosara argumenta que o gráfico de pizza tem, sim, um lugar válido na comunicação visual. Ele é familiar, acessível e eficaz para mostrar proporções em contextos não técnicos. Para públicos leigos ou apresentações rápidas, ele pode ser mais eficiente que gráficos mais analíticos.
Ele defende que não devemos julgar o gráfico de pizza pela régua da análise técnica, mas pelo seu papel comunicativo. O segredo está no uso consciente: poucas fatias, rótulos claros, e o propósito certo.
“Nem todo gráfico é feito pra análise minuciosa. Às vezes, a meta é comunicar uma ideia geral, e nisso o gráfico de pizza é ótimo.”
Robert Kosara
E então… vilão ou herói?
Depois desse passeio, a resposta é: depende.
Se você precisa comparar valores com precisão, o gráfico de pizza não é o melhor caminho. Mas se quer comunicar uma mensagem simples de forma visual e memorável, ele pode, sim, ser um bom aliado.
Cada autor nos mostra uma faceta dessa história:
- Playfair criou o gráfico pensando na comunicação acessível.
- Cleveland & McGill testaram sua eficácia perceptiva — e reprovaram.
- Tufte avaliou pelo critério da eficiência visual — e detonou.
- Kosara trouxe uma visão mais flexível e contextual, defendendo seu uso com bom senso.
No fim das contas, o gráfico de pizza não é bom ou ruim por si só. Ele é uma ferramenta — e como toda ferramenta, funciona bem em algumas mãos e mal em outras. O segredo está em saber quando ele ajuda a contar a história — e quando ele só deixa tudo mais confuso.
Sendo assim deixem o MIMIMI de lado e só vamos!